18 - NA PENSÃO A FLOR DE MINAS

O rapaz do quarto 14
é rebento, 24 anos,
da tradicional família mineira.
Olhou nos meus olhos
um dia
seu pecado feito carne
e viu meus cílios baterem.
Ele estremece,
foge o olhar - mas fala.
Disse-me que tem muito medo.
Nas noites frias de junho
ele atravessa a sala
e demora-se no banheiro.
Passa pela minha porta,
estou no leito,
mas não vejo, sinto.
O chão de táboas me diz
que ele foi para lá
ou que ele está de volta.
Me olha, estremece, tem medo.
Eu gosto de vê-lo assim
e ele me parece
feliz quando meus cílios batem
e descobre no meu olho
seu pecado feito gente.
Ouço tudo que acontece
dentro dele
no quarto 14.
Sua comunicação é na cama,
quando gira, tosse,
contorce seu medo - ela range,
ele ruge, mas não tem coragem.
Deitado, espero, seu pecado,
batendo os cílios e lembrando
a disciplinar Minas Gerais.
Seu pecado, a vontade, deitado
estou sempre,
esperando que na ida para o banheiro
a cupidez mineira
da família tradicional
permita o medo dele vir
pelo meu quarto
misturar na noite fria de junho
nossas humanidades
no pecado amplo,
fofo,
que deitado estou para isso...

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